9. Os dogmas da fé

9. Os dogmas da fé
A aula de hoje tratará de um conceito difícil de o homem moderno apreender: o dogma. A palavra dogma em grego quer dizer ensinamento. Não qualquer ensinamento, mas o ensinamento de um determinado assunto por uma autoridade constituída para tal. Nesse caso, quem ensina é Deus por meio de sua revelação pública, ou seja, Jesus Cristo, portanto, através da Igreja.
 
Os dogmas da fé
 
A aula de hoje tratará de um conceito difícil de o homem moderno apreender: o dogma. A palavra dogma em grego quer dizer ensinamento. Não qualquer ensinamento, mas o ensinamento de um determinado assunto por uma autoridade constituída para tal. Nesse caso, quem ensina é Deus por meio de sua revelação pública, ou seja, Jesus Cristo, portanto, através da Igreja.
 
Infelizmente, o mundo moderno usa a palavra dogma de forma pejorativa, relacionando-a à pessoas e situações ditatoriais, despóticas etc. E isso vem ocorrendo desde a Revolução Francesa.
 
Ocorre que o sentido é precisamente o inverso. É positivo o ensinamento dogmático da Igreja, pois ele clareia o caminho a ser percorrido pelo fiel católico.
 
Como falar ao mundo utilizando o conceito de dogma sem correr o risco de ser mal compreendido? Usando alguns sinônimos: ensinamento seguro, revelação de Deus, Palavra de Deus e, aos poucos, esclarecer o público, tirando a ideologia impregnada na palavra, trazendo o sentido verdadeiro dela.
 
O dogma, portanto, é algo que vem de Deus e assim, ao aceitá-lo, ocorre uma libertação, pois, a verdade vos libertará, ela é uma luz que ilumina e salva. Porém, isso não quer dizer que ela será agradável, no mais das vezes, ela incomoda.
 
O Catecismo da Igreja Católica, a respeito da formulação de um dogma diz que:
 
"O Magistério da Igreja empenha plenamente a autoridade que recebeu de Cristo quando define dogmas, isto é, quando, utilizando uma forma que obriga o povo cristão a uma adesão irrevogável de fé, propõe verdades constidas na Rcevelação divina ou verdades que com estas têm uma conexão necessária." (CIC 88)
Ora, mais uma vez estamos diante de uma situação difícil de se compreender no contexto atual: "... utilizando uma forma que obriga o povo cristão a uma adesão...", como fica, então, a liberdade religiosa? A liberdade religiosa continua em pé, pois o Magistério obriga o cristão católico. Ao aceitar a fé católica a pessoa livremente escolhe aceitar as verdades da fé católica. Se a pessoa não quer se tornar católica, ela exerce sua liberdade religiosa e não é obrigada a crer nos dogmas (ensinamentos) da Igreja. É muito simples.
 
Nesse sentido, o dogma é uma grande caridade da Igreja para com o seus fiéis. Por meio dele é possível ter uma noção de até onde se pode ir, é um caminho seguro por onde o fiel pode caminhar sem se perder. Ou, se assim o desejar, virar as costas para a Igreja, renegando o ensinamento. A proclamação de um dogma é a delimitação da fé católica.
 
"Há uma conexão orgânica entre nossa vida espiritual e os dogmas. Os dogmas são luzes no caminho de nossa fé que o iluminam e tornam seguro. Na verdade, se nossa vida for reta, nossa inteligência e nosso coração estarão abertos para acolher a luz dos dogmas da fé." (89)
Assim, é preciso virtude para o acolhimento do dogma. Quanto mais conversão, mais virtude, mas configuração a Cristo existe, mais facilmente o dogma é acolhido. Existe uma íntima relação entre a vida de fé e o dogma.
 
O Catecismo continua:
 
"Os laços mútuos e a coerência dos dogmas podem ser encontrados no conjunto da Revelação dos Mistérios de Cristo. Existe uma ordem ou hierarquia das verdades da doutrina católica, já que o nexo delas com o fundamento da fé cristã é diferente." (90)
O Concílio Vaticano I fala sobre o nexo entre os mistérios (dogmas). Assim, quando se compreende um dos dogmas, luzes são lançadas sobre outros, permitindo uma maior compreensão das verdades da fé católica. Eis:
 
"Decerto, a razão, iluminada pela fé, quando busca diligente, pia e sobriamente, consegue, com a ajuda de Deus, alguma compreensão dos mistérios, e esta frutuosíssima, quer pela analogia das coisas conhecidas naturalmente, quer pela conexão dos próprios mistérios entre si e com o fim último do homem; nunca, porém, se torna capaz de compreendê-los como compreende as verdades que constituem o seu objeto próprio. De fato, os mistérios divinos por sua própria natureza excedem de tal modo a inteligência criada, que, mesmo depois de transmitidos por revelação e acolhidos pela fé, permanecem ainda encobertos com o véu da mesma fé e como que envoltos em certa escuridão, enquanto durante esta vida mortal ‘somos peregrinos longe do Senhor, pois caminhamos guiados pela fé e não pela visão’". (DH 3016)
O Catecismo prossegue ensinando sobre o "senso sobrenatural da fé", que é a capacidade que os fiéis têm, por um dom do Espírito Santo, de identificar quando o que está sendo proposto não está de acordo com a verdadeira fé da Igreja. A Constituição Dogmática do Concílio Vaticano II sobre a Igreja, Lumen Gentium, em seu número 12, explica melhor sobre esse ponto:
 
"O Povo santo de Deus participa também da função profética de Cristo, difundindo o seu testemunho vivo, sobretudo pela vida de fé e de caridade oferecendo a Deus o sacrifício de louvor, fruto dos lábios que confessam o Seu nome (cfr. Hebr. 13,15). A totalidade dos fiéis que receberam a unção do Santo (cfr. Jo. 2, 20 e 27), não pode enganar-se na fé; e esta sua propriedade peculiar manifesta-se por meio do sentir sobrenatural da fé do povo todo, quando este, «desde os Bispos até ao último dos leigos fiéis» (22), manifesta consenso universal em matéria de fé e costumes. Com este sentido da fé, que se desperta e sustenta pela acção do Espírito de verdade, o Povo de Deus, sob a direcção do sagrado magistério que fielmente acata, já não recebe simples palavra de homens mas a verdadeira palavra de Deus (cfr. 1 Tess. 2,13), adere indefectivelmente à fé uma vez confiada aos santos (cfr. Jud. 3), penetra-a mais profundamente com juízo acertado e aplica-a mais totalmente na vida.
 
Além disso, este mesmo Espírito Santo não só santifica e conduz o Povo de Deus por meio dos sacramentos e ministérios e o adorna com virtudes, mas «distribuindo a cada um os seus dons como lhe apraz» (1 Cor. 12,11), distribui também graças especiais entre os fiéis de todas as classes, as quais os tornam aptos e dispostos a tomar diversas obras e encargos, proveitosos para a renovação e cada vez mais ampla edificação da Igreja, segundo aquelas palavras: ; «a cada qual se concede a manifestação do Espírito em ordem ao bem comum» (1 Cor. 12,7). Estes carismas, quer sejam os mais elevados, quer também os mais simples e comuns, devem ser recebidos com acção de graças e consolação, por serem muito acomodados e úteis às necessidades da Igreja. Não se devem porém, pedir temerariamente, os dons extraordinários nem deles se devem esperar com presunção os frutos das obras apostólicas; e o juízo acerca da sua autenticidade e recto uso, pertence àqueles que presidem na Igreja e aos quais compete de modo especial não extinguir o Espírito mas julgar tudo e conservar o que é bom (cfr. 1 Tess. 5, 12. 19-21)." (LG 12)
Assim, o conjunto dos fiéis, guiados pelo Magistério, não pode se enganar. Da mesma forma que o Papa possui o ministério da infalibilidade, ambos são amparados na infalibilidade da IGREJA. O sentido da fé acontece pelo Espírito Santo.
 
Uma outra realidade contemplada pelo Catecismo é o crescimento na comrpeensão da fé. A fé católica não é a fé de um livro, mas sim, de Jesus Cristo, Palavra que se fez carne. O corpo de Cristo continua ao longo da história na Igreja. Assim, a fé de cada um no que Jesus e os apóstolos deixaram é uma realidade que acontece dentro de um organismo vivo que é a Igreja.
 
A Revelação de Deus já aconteceu, portanto, mas a Igreja cresce na compreensão dessa revelação a cada dia. Hoje é possível enxergar ainda mais do que Santo Agostinho enxergava. Os dois mil anos de história fazem com que as realidades da fé sejam mais perfeitamente enxergadas hoje do que por aqueles que viveram no século V, por exemplo.
 
A Constituição Dogmática Dei Verbum, em seu nº 08, fala claramente sobre a revelação divina e de como progride, ainda hoje, a percepção da Igreja nas verdades da fé, por meio da assistência do Espírito Santo:
 
"E assim, a pregação apostólica, que se exprime de modo especial nos livros inspirados, devia conservar-se, por uma sucessão contínua, até à consumação dos tempos. Por isso, os Apóstolos, transmitindo o que eles mesmos receberam, advertem os fiéis a que observem as tradições que tinham aprendido quer por palavras quer por escrito (cfr. 2 Tess. 2,15), e a que lutem pela fé recebida dama vez para sempre (cfr. Jud. 3)(4). Ora, o que foi transmitido pelos Apóstolos, abrange tudo quanto contribui para a vida santa do Povo de Deus e para o aumento da sua fé; e assim a Igreja, na sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações tudo aquilo que ela é e tudo quanto acredita.
 
Esta tradição apostólica progride na Igreja sob a assistência do Espírito Santo (5). Com efeito, progride a percepção tanto das coisas como das palavras transmitidas, quer mercê da contemplação e estudo dos crentes, que as meditam no seu coração (cfr. Lc. 2, 19. 51), quer mercê da íntima inteligência que experimentam das coisas espirituais, quer mercê da pregação daqueles que, com a sucessão do episcopado, receberam o carisma da verdade. Isto é, a Igreja, no decurso dos séculos, tende contìnuamente para a plenitude da verdade divina, até que nela se realizem as palavras de Deus.
 
Afirmações dos santos Padres testemunham a presença vivificadora desta Tradição, cujas riquezas entram na prática e na vida da Igreja crente e orante. Mediante a mesma Tradição, conhece a Igreja o cânon inteiro dos livros sagrados, e a própria Sagrada Escritura entende-se nela mais profundamente e torna-se incessantemente operante; e assim, Deus, que outrora falou, dialoga sem interrupção com a esposa do seu amado Filho; e o Espírito Santo - por quem ressoa a voz do Evangelho na Igreja e, pela Igreja, no mundo - introduz os crentes na verdade plena e faz com que a palavra de Cristo neles habite em toda a sua riqueza (cfr. Col. 3,16)." (DV 08)
Portanto, os dogmas são verdades da fé que sempre existiram. Por causa de situações exteriores, a Igreja achou por bem manifestar-se, impedindo assim que os fiéis sejam desviados do reto caminho. Os fiéis, por sua vez, por uma assistência do Espírito Santo, possuem o chamado sentido sobrenatural da fé, que é a capacidade de perceber uma pregação ou uma ação em dissonância com o que ensina a Santa Igreja. Por fim, embora a Revelação tenha sido concluída com a morte do último apóstolo, a Igreja ainda hoje progride na compreensão dessa mesma Revelação, sempre à luz do Espírito Santo, pois, é como disse São gregório Magno: "as palavras divinas crescem com o leitor".