14. O Cânon das Sagradas Escrituras

14. O Cânon das Sagradas Escrituras
A palavra cânon é de origem grega e quer dizer regra. Nesse caso, especificamente, refere-se aos livros que pertencem à Bíblia. Ao contrário do que muitas pessoas pensam até ingenuamente, a escolha dos livros sagrados não foi rápida e nem unânime. Aprenda como o cânon bíblico foi formado.
 
 
O Cânon das Sagradas Escrituras
 
A palavra cânon é de origem grega e quer dizer regra. Nesse caso, especificamente, refere-se aos livros que pertencem à Bíblia. Ao contrário do que muitas pessoas pensam, até ingenuamente, a escolha dos livros sagrados não foi rápida e nem unânime.
 
O Catecismo da Igreja Católica afirma em seu número 120, que a Bíblia católica possui 72 livros, que é um número diferente das chamadas Bíblias protestantes. Vejamos:
 
"[...] Esta lista completa é denominada "Cânon" das Escrituras. Ela comporta 46 (45, se contarmos Jr e Lm juntos) escritos para o Antigo Testamento e 27 para o Novo:
 
Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio, Josué, Juízes, Rute, os dois livros de Samuel, os dois livros dos Reis, os dois livros das Crônicas, Esdras e Neemias, Tobias, Judite, Ester, os dois livros dos Macabeus, Jó, os Salmos, os Provérbios, o Eclesiastes (ou Coélet), o Cântico dos Cânticos, a Sabedoria, o Eclesiástico (ou Sirácida), Isaías, Jeremias, as Lamentações, Baruc, Ezequiel, Daniel, Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias, para o Antigo Testamento; os Evangelhos de Mateus, de Marcos, de Lucas e de João, os Atos dos Apóstolos, as Epístolas de S. Paulo aos Romanos, a primeira e a segunda aos Coríntios, aos Gálatas, aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses, a primeira e a segunda aos Tessalonicenses, a primeira e a segunda a Timóteo, a Tito, a Filêmon, a Epístola aos Hebreus, a Epístola de Tiago, a primeira e a segunda de Pedro, as três Epístolas de João, a Epístola de Judas e o Apocalipse, para o Novo Testamento." (120)
O que se vê é que faltam alguns livros nas Bíblias protestantes e a pergunta evidente é: quem é que tem razão? O estudo desse tema é fundamental dentro da perspectiva apologética, ou seja, de defesa da fé católica. É preciso entender como o cânon foi composto e por quem, para ser possível demonstrar com segurança que os católicos é que estão na verdadeira Igreja e que o chamado cristianismo bíblico dos protestantes não se sustenta.
 
Este cristianismo pode ser comparado a um homem que deseja ficar em pé sobre os seus próprios ombros. É impossível. A autoridade da Bíblia vem de Deus, pois ela é a Palavra de Deus, contudo, quem decidiu quais são os livros da Bíblia foi a Igreja Católica, conforme historicamente comprovado.
 
O protestantismo nasceu de uma crise eclesiológica, ou seja, Lutero e alguns homens viram o pecado de membros da Igreja e a renegaram, optando por terem fé somente na Igreja. Ocorre que não faz sentido, pois, para aceitar os livros sagrados, necessariamente eles precisam aceitar a autoridade da Igreja que os escolheu. Trata-se do problema fundamental do protestantismo que parece simples, mas é bastante complexo.
 
O problema quanto ao cânon das Sagradas Escrituras nasce do fato de que a Igreja demorou um certo tempo para definí-lo. O documento mais antigo que aponta a lista dos livros vem do "Decretum Damasi, ou explicação da fé", no século IV:
 
Agora tratemos das Escrituras divinas, o que a Igreja católica universal deve acolher e que deve evitar.
 
Começa a ordem do Antigo Testamento: Gênese, 1 livro; Êxodo, 1 livro; Levítico, 1 livro; Números, 1 livro; Deuteronômio, 1 livro;, Josué, 1 livro; Juízes, 1 livro; Rut, 1 livro; Reis, 4 livros, <= Samuel, 2; Reis 2> Paralipômeno<= Crônicas> 2 livros; 150 Salmos [Saltério], 1 livro; Salamão [Salomão], 3 livros; Provérbios, 1 livro; Eclesiastes, 1 livro; Cântico dos Cânticos, 1 livro; Sabedoria, 1 livro; Eclesiástico, 1 livro.
 
Igualmente, a ordem dos Profetas: Isaías, 1 livro; Jeremias, 1 livro; com as Cinot, isto é suas lamentações; Ezequiel, 1 livro; Daniel, 1 livro; Oséias, 1 livro; Jonas, 1 livro; Naum, 1 livro; Ambacum [Habacuc], 1 livro; Sofonias, 1 livro; Ageu, 1 livro; Zacarias, 1 livro; Malaciel [Malaquias], 1 livro.
 
Igualmente a ordem das histórias: Jó, 1 livro; Tobias, 1 livro; Esdras [Hesdras], 2 livros <= 1 de Esdras, 1 de Neemias>; Ester, 1 livro; Judite, 1 livro; Macabeus, 2 livros.
 
Igualmente, a ordem da Escritura do Novo e eterno Testamento, que a Igreja santa e católica [romana] reconhece e venera: dos Evangelhos [4 livros:] segundo Mateus, 1 livro; segundo Marcos, 1 livro; segundo Lucas, 1 livro; segundo João, 1 livro.
 
[Igualmente, dos Atos dos Apóstolos, 1 livro] Cartas de Paulo [apóstolo], em número de 14: aos Romanos, 1 [ep.], aos Coríntios, 2[ep.], aos Efésios, 1; aos Tessalonicenses, 2; aos Gálatas, 1; aos Filipenses, 1; aos Colossenses, 1; a Timóteo, 2; a Tito, 1; a Filímon [Filêmon], 1; aos Hebreus, 1.
 
Igualmente, as cartas canônicas [(cân. ep.], em número de 7: do apóstolo Pedro 3 cartas, do apóstolo Tiago 1 ep., do apóstolo João 1 ep., do outro João, o presbítero, 2 ep., do apóstolo Judas o Zelote, 1 ep. Termina o cânon do Novo Testamento. (DH 179 e 180)
O livro "O Cânon das Sagradas Escrituras", do Prof. Alessandro de Lima apresenta uma detalhada pesquisa histórica que confirma a autoridade da Igreja na escolha dos livros sagrados e ainda procura esclarecer a controvérsia estabelecida entre católicos e protestantes acerca do mesmo tema. Vejamos:
 
"Iniciativas tanto católicas quanto protestantes têm vinculado principalmente nos sítios da internet alguns dos testemunhos primitivos que aqui foram transcritos procurando provar qual era a lista dos livros canônicos estabelecida na Igreja dos primeiros séculos. Nenhum desses relatos pode ser utilizado com esse intuito." (p. 77)
Isso quer dizer que a ampla gama de testemunhos compilados naquela obra, nem mesmo as várias listas contendo os supostos livros canônicos podem ser utilizadas para afirmar a lista canônica verdadeira. A lista foi elaborada pela Tradição da Igreja, depois de reconhecida e chancelada pelo Magistério da Igreja. Desta forma, o príncipio da sola scriptura cai por terra. Continua o autor:
 
... o próprio conjunto mostra a incerteza que pairava na igreja sobre este tema e porque dentre eles não há o mais importante ou fiel. Todas as listas canônicas aqui transcritas não vieram de hereges ou de grupos sectários, mas de homens comumente muito considerados na igreja primitiva ou medieval, dos quais muitos sofreram martírio ou exílio por amor a Cristo. Mas, a partir deles, devemos observar algumas coisas:
 
1. A Igreja dos primeiros tempos não adotou para o Antigo Testamento o cânon hebraico. Livros como Baruc, a carta de Jeremias, Suzana e o livro Bel e o Dragão, os dois últimos apêndices do livro de Daniel que constam na Septuaginta foram consensualmente recebidos como canônicos.
 
2. Embora os primeiros cristãos, seguindo o exemplo dos apóstolos, usassem a versão da Septuaginta, nem todos os seus livros eram usados na leitura na Igreja. Foram consensualmente recusados o primeiro livro de Esdras, o terceiro e quarto livros de Macabeus, as odes e os salmos de Salomão.
 
3. Os livros de Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, primeiro e segundo Macabeus, eram consensualmente utilizados, em algumas regiões eram recebidos como canônicos.
 
4. O livro de Ester não foi recebido como canônico por todos.
É sabido que o Antigo Testamento foi compilado inicialmente em hebraico. O livro era formado por três partes: 1. a Torá que continha os cinco primeiros livros, também chamados de pentateuco; 2. O Neviim que continha os Profetas; 3. O Kethuvim que continha os Escritos. A diferença entre a Tanakh (Bíblia hebraica) e o Antigo Testamento adotado pela Igreja Católica estava no livro que continha os "Escritos".
 
Interessante frisar que foi muito lento o processo de canonização desses livros. Primeiramente foram canonizados os livros da Torá, posteriormente os dos Profetas e, somente muito tempo depois os dos Escritos. Na época de Jesus o cânon da Bíblia judaica ainda não estava fechado. Portanto, os judeus, contemporâneos de Jesus, ainda debatiam sobre quais eram os livros sagrados. Por exemplo, os saduceus só criam nos livros da Torá, já os fariseus aceitavam os Profetas e os Escritos, mas não totalmente, pois achavam que a inspiração dos Escritos ainda não estava concluída.
 
Jesus deu uma ordem aos Apóstolos: "ide pelo mundo e evangelizai". Ora, o mundo daquela época falava o grego, que era o equivalente ao inglês de hoje, portanto, os Apóstolos começaram a pregar o Evangelho em grego, mas como, se a Bíblia estava em hebraico? Os Apóstolos, então, passaram a utilizar uma tradução da Bíblia do hebraico para o grego denominada Septuaginta, que havia sido elaborada em Alexandria antes de Cristo.
 
Ocorre que na Tradução dos Setenta, como também é chamada a Septuaginta, estão contidos aqueles sete livros. Mas estão contidos outros textos também que não foram canonizados pela Igreja. Como trabalhar com essa diferença? Recordando-se simplesmente que a lista canônica não foi fornecida pelos judeus de Jâmnia e nem pelos judeus de Alexandria, mas sim, pela Tradição da Igreja, corroborada pelo Magistério.
 
Portanto, para resumir, é possível dizer que existem livros que entraram no cânon logo de imediato, são os chamados protocanônicos, sobre outros livros pairou uma certa controvérsia, mas, por fim, entraram na lista, são os deuterocanônicos e, por fim, aqueles que não entraram na lista, são os apócrifos.
 
A definição da lista oficial deu-se após um longo e lento processo de conscientização e recepção pela Igreja; processo histórico e amplamente documentado para aqueles que querem, de fato, encontrar a verdade.
 

Referência Bibliográfica

  1. "O Cânon Bíblico - A Origem da Lista dos Livros Sagrados" - Prof. Alessandro Limahttps://books.google.com.br/o-canon-biblico-alessandro-lima