9- Introdução às Cruzadas

9- Introdução às Cruzadas

Na Baixa Idade Média, homens de todos os lugares da Europa saíram de suas casas e partiram ao Oriente, para salvar as suas almas e defender a Terra Santa. Descubra, nesta aula de História da Igreja Medieval, o que realmente foram as Cruzadas e por que elas se tornaram um dos principais cavalos de batalha dos inimigos da Igreja Católica.

 

É farto o material a respeito das Cruzadas. São duzentos anos de história, envolvendo múltiplos eventos diferentes. Não bastasse isso, trata-se de um tema polêmico. Principalmente por ocasião dos Ataques de 11 de Setembro – antes dos quais o próprio Osama Bin Laden havia declarado uma " jihad contra judeus e cruzados" [1] – o exame histórico das Cruzadas voltou à tona. Afinal, o que foram realmente as Cruzadas: guerras injustas e violentas dos cristãos contra os muçulmanos ou, ao contrário, uma história épica, romântica e incriticável – como pintam outras pessoas?
 
Nem tanto ao céu, nem tanto à terra. Para um exame acurado acerca das Cruzadas, deve-se prescindir de preconceitos ou reducionismos e partir a uma investigação rigorosa dos fatos e documentos históricos. Antes de tudo, importa dizer que essa visão negativa sobre esse período histórico não foi criada pelos árabes – como pensa, por exemplo, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama –, mas surgiu justamente no Ocidente, por obra de pensadores iluministas e anticlericais. Agora, essa mentira é creditada por terroristas islâmicos, que a usam como justificativa para uma "vingança".
 
A verdade é que as Cruzadas não foram uma "guerra santa". Esse conceito – que está ligado a jihad – é muçulmano. O islamismo, de fato, expandiu-se principalmente por guerras e investidas políticas. Na religião cristã, por outro lado, não existe tal coisa, pois a guerra é sempre um mal. Existe sim – e a genialidade de Santo Agostinho e de Santo Tomás de Aquino ajudou a elaborar este pensamento [2] – a chamada "guerra justa", que acontece quando se esgotam todas as alternativas de conciliação.
 
Durante o pontificado de São Gregório VII, o Imperador de Constantinopla, Aleixo Comneno, pediu ajuda ao Ocidente para recuperar os territórios do Oriente Próximo que haviam sido tomados pelos muçulmanos. Entre as conquistas dos árabes, estava a Terra Santa. Nesta época, os cristãos, que desde a época de Santa Helena peregrinavam aos lugares santos, sofriam para visitar o local em que Cristo viveu. Às portas de Jerusalém, eram obrigados a pagar altas somas de impostos, sem falar dos assaltos, assassinatos e sacrilégios de que eram testemunhas e até mesmo vítimas.
 
A notícia de todos estes fatos indignou a Europa que, à convocação do Papa Urbano II, decidiu se organizar para defender Jerusalém. Algumas pessoas disseram que as Cruzadas foram convocadas pelo Sumo Pontífice porque este queria "mostrar o seu poderio militar". Nada mais falso. Seria ilógico que o Papa mandasse para o Oriente justamente os exércitos que o defendiam, não fosse por uma verdadeira urgência.
 
Para incentivar os cavaleiros, nobres e outras pessoas a ajudarem o Império Bizantino, Urbano II reuniu um concílio e agraciou os cruzados com uma indulgência plenária. Este prêmio por participar de uma guerra pode parecer absurdo, mas sempre foi uma constante na história dos povos e nações: um soldado que morre para defender a sua pátria está fazendo algo bom e deve ser condecorado por isso. É claro que hoje, por conta da propaganda esquerdista associando a polícia e os militares à violência, as pessoas não têm mais essa mentalidade. Mas é deste modo que os bons soldados devem ser honrados: como heróis.
 
Por isso, a Igreja sempre estimou os cruzados. Ela enxergava como autêntica caridade que eles saíssem de suas casas e da tranquilidade de seus lares para enfrentarem o desconhecido e o imprevisível e defenderem Jerusalém. Os que se decidiam a partir à Terra Santa eram, pois, assinalados com a Cruz, tinham suas espadas abençoadas – sob a prece de que não derramassem sangue inocente – e, enfim, partiam em peregrinação. É com este sentido heroico de doação que aconteceram as Cruzadas.
 
Porém, para os marxistas, que só conseguem ler a história a partir do viés econômico, o único objetivo desses soldados seria a conquista de riquezas ou a posse de novas terras. Tal tese não faz absolutamente nenhum sentido. Por que esses homens deixariam a Europa, se as terras ali eram abundantes e férteis? Na verdade, os cristãos "se cruzavam" porque tinham fé; vendiam suas propriedades porque criam e queriam cumprir a vontade de Deus. É claro que isto não os canoniza. O fato de serem homens de fé não os impedia de, ao longo do caminho, cometerem crimes e desmandos – atos que foram condenados pelos próprios Papas da época.
 
A Primeira Cruzada que aconteceu – depois da fracassada "Cruzada Popular", conduzida por Pedro, o Ermitão [3] – começou com um voto de fidelidade dos soldados ao Imperador de Constantinopla: qualquer terra que fosse tomada pelos cruzados deveria passar a propriedade do Império Bizantino. Depois de atravessarem o Bósforo, eles entraram na Turquia e tomaram Niceia. Mais adiante, acamparam em Antioquia, na Síria e, depois de ficarem do lado de fora por meses e perderem inúmeros soldados, conseguiram conquistar a cidade. Enfim, em 15 de julho de 1099, animados por Godofredo de Bulhões – que dizia ter visto São Jorge no alto do Monte das Oliveiras –, os cruzados tomaram a Terra Santa.
 
Foi grande o número de mortes em Jerusalém e dificilmente se pode justificar tudo o que os "soldados de Cristo" fizeram aí. O fato é que, após terem a Cidade Santa nas mãos, os cruzados, ao invés de entregarem-na a Aleixo, decidiram mantê-la para si. Por conta de um mal entendido, eles interpretaram a falta de ajuda do Imperador em Antioquia como uma "traição" e, por isso, se acharam livres do juramento que tinham feito em Constantinopla. Instauraram, então, o Reino Latino de Jerusalém, cujo primeiro rei foi justamente Godofredo de Bulhões. Este líder militar que, em sua juventude, ajudara Henrique IV a invadir a Roma de São Gregório VII, certamente partiu em peregrinação para purgar os pecados de sua vida passada. Ao ser escolhido como rei do lugar, no entanto, recusou-se a ser coroado: não queria tal honra no mesmo lugar em que Cristo tinha sido coroado de espinhos. Foi designado, então, simplesmente como Defensor do Santo Sepulcro.
 
Essas são algumas informações relevantes da primeira das Cruzadas. Como se pode ver, foram movimentos cheios de luzes e trevas, acertos e erros – assim como os cruzados, homens de fé e, ao mesmo tempo, pecadores. Neste período, foi importante o papel dos Papas para coibir e condenar os abusos dos comandantes e soldados nas expedições ao Oriente. Cruzadas inteiras – cheias de crimes e injustiças – chegaram a ser excomungadas pelo Papa. Não era, pois, tudo o que se lançava ao outro lado do Bósforo que merecia o selo de aprovação da Igreja. Por isso, importa estudar não só os fatos históricos, mas também a reação das autoridades eclesiásticas ao que aconteceu.
 
Recomendações
 
  1. Sobre o relacionamento entre São Gregório VII e o Rei Henrique IV, cf. AV. 106 – O papel da Igreja no mundo político
  2. Sobre a Cruzada Popular conduzida por Pedro, o Ermitão, cf. AV. 107 – Guerra cultural: como vencer o projeto marxista de poder
  3. The Concise History of the Crusades (Critical Issues in World and International History) – Thomas F. Madden
  4. Crusades: The Illustrated History – Thomas F. Madden
 
Referências bibliográficas
 
  1. Jihad Against Jews and Crusaders, 23 de fevereiro de 1998
  2. Cf. Suma Teológica, II-II, q. 40, a. 1
  3. Cf. AV. 107 – Guerra cultural: como vencer o projeto marxista de poder.
        Fonte:Pe Paulo Ricardo