Papas do Século XI (parte I) – tirando o pé da lama...

23/10/2014 11:29

Depois das coisas terríveis acontecidas durante a pornocracia no século X e do dobrado pelo qual passou a Igreja durante os primeiros tempos do Sacro Império Romano, chegamos ao século XI.  Poderíamos achar que a decadência espiritual do século anterior afundaria a Igreja, mas o que se deu foi justamente ao contrário: sua autoridades espiritual se fez mais e mais presente no mundo, e suas obras a partir desse século foram responsáveis por toda estruturação da sociedade ocidental.

O professor de história medieval da Universidade do Rio de Janeiro (UNIRIO), Paulo André Parente, em uma de suas aulas disse: “a hegemonia espiritual da Igreja Católica no Ocidente durante a Idade Média, se existiu, deu-se tão somente no século XI”.  Entenderam? Mais uma prova de que a propalada “hegemonia” – ou seja, aquele velho papinho de que a Igreja Católica era toda-poderosa e tinha um mega poder na Idade Média – deu-se apenas durante um curto período, não cabendo aos detratores ficarem destilando suas bobagens por aí.  A Igreja de Nosso Senhor Jesus sempre teve que lutar, lutar muito contra as mazelas do mundo.

Então vamos aos Papas do século XI.

papa_silvestre_ii_inventorSilvestre II – Vive la France! Gerbert D’Aurillac foi o primeiro Papa francês da história. Sucedeu Gregório V, sendo muito querido do Imperador Oto III, que foi seu aluno 20 anos antes. Monge beneditino, Silvestre II foi um grande intelectual. Atribui-se a ele a invenção do relógio mecânico, dando prosseguimento aos ideais de São Nicolau.

Esse papa foi um dos principais idealizadores da universalidade da Igreja - ou seja, a grosso modo, podemos dizer que ele desejava que a Igreja fosse mais “católica” do que “romana”.

Bom, a rapaziada em Roma não curtiu muito a ideia de universalidade – afinal, eles temiam perder o seu poder de influência local – e, de forma não muito delicada, retiraram tanto o Papa quanto o Imperador da Cidade Eterna, a qual o pontífice retornou em fevereiro de 1001.

Reparem que esse foi o Papa do milênio, época em que muita pitonisa, assim como aconteceu no ano 2000, previa o fim do mundo. Denunciou a simonia (venda de bens espirituais), o nepotismo, as violações do celibato e possibilitou aos monges a eleição do abade dentro do monastério. Foi sepultado na Basílica de Latrão. Papa de 999 a 1003.

João XVII - Era um passo para frente e outro para trás.  João XVII foi um papa daquele tipo “nada a acrescentar”. Colocado no trono de Pedro por João Crescentii – Capo dos Crescentii, a poderosa família romana – seu papado durou apenas seis meses.

Sobre esse papa pairam mais dúvidas que certezas. Reparem que não falei de nenhum papa João XVI. Isso ocorre porque entre João XV e XVII houve o antipapa João XVI, e João XVII embarcou nessa contagem furada. Em outras palavras, oficialmente, não existe um papa João XVI. A única coisa interessante ocorrida nesse curto período foi o início da evangelização dos eslavos (para quem não sabe: poloneses, sérvios, russos, bogomilos etc.). Papa de maio a novembro de 1003.

papa_joao_XVIIIJoão XVIII – Durante o pontificado de João XVIII, os Crescentii deram mole e Gregório Tusculano – chefe da tenebrosa família Teoficalto – assumiu o poder temporal da cidade. Nos bastidores, se tramava um retorno aos tempos negros de Marózia Teofilacto.

Gregório apoiou o papa João XVIII, mas tencionava colocar no trono de Pedro um de seus filhos – não o fez por serem ainda crianças. Dessa vez, o Espírito Santo deu à Santa Igreja um grande Papa. João XVIII foi um grande realizador e trouxe a paz em vários territórios sobre influência da Igreja Católica. Era um lutador, e insistiu para espalhar o cristianismo nos lugares onde o paganismo ainda era uma realidade viva.  Canonizou santos mártires poloneses e insistiu no trabalho iniciado por João XVII.

Velho e cansado, abdicou do trono e foi viver seus últimos dias como monge na Basílica de São Paulo Fora-dos-Muros, servindo aos mais humildes. Durante seu pontificado a cristandade uniu-se como a muito não se via.  Embora essa situação tenha esboroado com a morte de João Crescêncio, que era simpático aos bizantinos. Papa de 1004 a 1009.

Sérgio IV – Chamava-se Pietro Boccapecora. Mudou seu nome para Sérgio para não ser confundido com o Santo Apóstolo.

Realizava um bom papado quando, em 1012, durante uma revolta, veio a falecer. Suspeita-se que tenha sido assassinado juntamente com o chefe da família Crescêncio, João II. Foi sepultado na Basílica de São João de Latrão.

Bento VIII – EITA! Olha aí… Outro Papa Teofilacto! Isso mesmo, Bento VIII era Teofilacto, da família ascendente tusculana (se você não conhece a história dos Teoficalto, clique aqui para entender). E, para piorar, Bento VIII inaugurou uma série de três papas leigos, todos Teofilactos. Era um milicão, um tipo de “seu puliça”.

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O papa Bento VIII em ação

Apesar do que possa parecer, não foi um mau papa.  Era rígido e defendeu com unhas e dentes as propriedades eclesiásticas e os direitos espirituais da igreja contra abades engraçadinhos que achavam que podiam fazer o que lhes desse na telha.  Chutou de volta os sarracenos para longe das praias italianas.  Era severíssimo no que tange à questão do celibato, inclusive reduzindo à servidão subdiáconos “casadoiros”.

Está sepultado na basílica de São Pedro. Papa de 1012 a 1024.

João XIX – Era irmão do antecessor, ou seja, outro Teofilacto. Quando se lembra de um certo sobrinho neto desse Papa que usava o mesmo nome (João XII), chega a dar arrepios! Passou de leigo a Papa no dia de sua eleição (pra lá de ilegal). Nunca esteve tranquilo, vide o passado da família e a sua eleição.

Chovem acusações contra seu pontificado, principalmente de simonia, mas nada nas fontes leva a crer na veracidade das acusações. Papa de 1024 a 1032.

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Já pensou se houvessem quatro papas coexistindo – validamente eleitos – em vez de um só? Impensável, não? Contaremos esta e outras histórias na parte II sobre os papas do século XI. Acompanhem!

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